quarta-feira, 12 de maio de 2010

Martinho da Vila e Noel Rosa


Estátua de Noel Rosa, localizada na entrada de Vila Isabel.

Foi por acaso, sem planejar, que Martinho José Ferreira começou a moldar Poeta da cidade, álbum-tributo lançado agora em homenagem aos 100 anos de nascimento do poeta maior da Vila Isabel, Noel Rosa. Convidado pelo departamento de Letras da PUC-Rio, que preparava um livro de ensaios sobre o compositor, Martinho passou a selecionar e gravar algumas versões para clássicos do mestre, que serviriam de luxuoso adendo aos trabalhos burilados por 14 pesquisadores. Mas aos 72 anos, o compositor que cultivou por décadas o bordão “devagar, devagarinho” como retrato de sua persona relaxada, pisou firme no acelerador e deu ponto final às linhas melódicas antes que o registro escrito estivesse pronto.

– Eu sempre pensei em gravar um disco com algumas coisas de Noel, mas não andei com a ideia. Até que o pessoal da PUC pediu que eu gravasse algumas músicas, que estariam num CD encartado no livro, mas acontece que o CD ficou pronto e o livro, não – explica. – Acho que lidar com 14 escritores é mais difícil, fiz o meu tranquilamente e terminei. Aí o pessoal da Biscoito ficou sabendo e veio me dizer que a gente não podia deixar a data passar em branco. 

Entre tantos poetas, filósofos ou menestréis da música popular brasileira, Noel Rosa é, sem dúvida, um dos precursores. Homem branco da cidade, mas desprovido de preconceitos, cruzou a linha invisível que separa o morro do asfalto para bebericar da fonte dos compositores instalados no cume. Ao aliar o olhar aguçado de andarilho urbano à sensibilidade boemia que rescende ao talento artístico inato dos compositores do morro, Noel rabiscou emboladas, toadas e cateretês até abraçar o samba como sinônimo de sua existência. Fez do gênero a plataforma espelhada que retratava os costumes de uma sociedade moderna em formação, no início do século passado.

– Noel foi importantíssimo para a definição do samba como o conhecemos hoje. Ele surge num período em que o samba era amaxixado... É a partir dele que se configura esse jeito carioca que vemos hoje – teoriza. – Isso foi possível porque Noel admirava os sambistas do morro. Ele se aproximou dos compositores favelados, como o Cartola e o Ismael Silva. A partir daí, mudou e urbanizou a linguagem. Noel não tinha preconceitos, fazia parceria com todos. E por isso ele é importante não só pela obra, mas pela postura social que adotou.

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